Primeiro dia de inverno

Noite cerrada. Chegou, de repente, o frio e, com ele, a necessidade de aquecer uma alma que, estando já enfraquecida, conseguira manter-se iluminada nos últimos meses à custa de apanhar um brilhozinho dos raios de sol que haviam conquistado o fim do Verão e o princípio do Outono.
Noite cerrada. Breu. Chuva intensa. Desabou o céu em poucos minutos, pelas três horas da madrugada, com nuvens de bocarras abertas a expulsar água a rodos.
Noite cerrada. O Verão transformado no seu oposto, sem ponte, sem dias assim-assim, para temperar o espírito com menos sal e prepará-lo para a dieta que há que cumprir. O sono foi transformado em coisa pouco sã, teimando em ignorar a madrugada e com vontade de provocar pesadelos à mente desperta.
Noite cerrada. Desaba o mundo exterior. Desaba o mundo interior, que não resiste à tempestade e deixa entrar o vento furioso, que fustiga as janelas, direitinho ao coração. Arrefece-o. A mente, cada vez mais acordada, ouve trovões que não existem, gritos que não se pronunciam, sirenes que não tocam. Escutará o coração a endurecer? Procura então meditar, abandonar o mundo, ignorar o temor que os sons provocam. Procura alhear-se, evadir-se. Adormece, finalmente.
Noite cerrada. Vieram os sonhos. Foram os pesadelos.

© Elisabete Lucas

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